A doença renal crônica (DRC) é hoje um sério problema de saúde pública no Brasil e no mundo. Apesar de um número crescente de publicações abordando os mecanismos que levam à DRC e à sua progressão, são raros os estudos experimentais cujos resultados podem ser transpostos para a prática clínica. Um dos motivos para essa desproporção é o fato de que, em geral, o tratamento é iniciado em concomitância com a instalação da doença, o que aumenta artificialmente a eficácia da terapêutica, uma vez que os fatores patogênicos envolvidos podem ser mais facilmente neutralizados. Resultados bem menos animadores são obtidos se o tratamento é iniciado em fases mais tardias, quando a interação entre esses fatores, muito mais complexa, exige terapêutica mais vigorosa e a associação de dois ou mais fármacos. No presente estudo, examinamos a evolução das lesões renais em um modelo estabelecido de DRC a nefrectomia de 5/6 (Nx) - e o efeito de uma associação entre um bloqueador do receptor AT-1, o losartan (L), e a hidroclorotiazida (H) até agora, a mais eficaz manobra terapêutica para o modelo em questão. Cento e noventa e seis ratos Munich-Wistar machos e adultos foram submetidos a Nx e divididos em quatro grupos: Nx, sem tratamento; L, recebendo monoterapia com L; LH, recebendo a associação L + H; e AHHz, tratados com uma associação entre um bloqueador de canais de cálcio, a anlodipina, um relaxante da musculatura lisa, a hidralazina, e H. Este último grupo serviu para baixar a pressão arterial (PA) independentemente do sistema renina-angiotensina e assim funcionar como controle para esse parâmetro. Um grupo de ratos submetidos a nefrectomia simulada (Sham) foi também estudado. Dois protocolos de estudo foram seguidos. No primeiro (Protocolo 1), os tratamentos foram iniciados 60 dias após Nx, visando simular uma fase relativamente precoce da DRC, com comprometimento funcional e dano estrutural ainda limitado. No segundo (Protocolo 2), os mesmos tratamentos foram iniciados 120 dias após Nx, procurando mimetizar uma DRC humana em estágio mais avançado. Conforme esperado, a DRC progrediu para estágios mais avançados em ambos os protocolos. No entanto, a gravidade da DRC e a mortalidade no Protocolo 2 foram muito maiores do que no Protocolo 1. Apesar dessas diferenças, a eficácia dos tratamentos foi comparável nos dois protocolos. O tratamento com L promoveu proteção apenas parcial contra os danos observados no Grupo Nx. A associação com H propiciou proteção muito mais eficiente, logrando, em ambos os protocolos, trazer a PA, a albuminúria, a taxa de proliferação celular tubular/intersticial e os níveis plasmáticos de aldosterona a níveis inferiores aos observados antes dos tratamentos. Apesar de não reverter a progressão da glomeruloesclerose e da expansão/inflamação intersticial, a associação LH deteve completamente, em ambos os protocolos, a progressão dessas lesões. Por outro lado, a associação AHHz, embora também tenha normalizado a PA, não impediu a progressão da nefropatia nem a da albuminúria, indicando que o efeito protetor da associação LH não se deveu a uma ação hemodinâmica sistêmica. Conclusões: 1) os presentes resultados não apoiam o conceito segundo o qual os tiazídicos deixam de funcionar em fases muito avançadas da DRC, em que a maior parte da função renal já foi perdida; 2) a associação LH é eficiente mesmo em fases avançadas da nefropatia no modelo Nx, detendo sua progressão e mantendo as lesões no nível pré-tratamento, sem, no entanto, fazê-las regredir; 3) essa renoproteção não pode ser explicada somente pelo efeito anti-hipertensivo observado, embora não se possa descartar uma ação sobre a pressão intraglomerular; 4) os mecanismos do efeito renoprotetor da associação LH ainda não estão claros, embora seja provável que envolvam uma combinação de efeitos hemodinâmicos e antiinflamatórios, além de uma notável redução da produção de aldosterona Chronic kidney disease (CKD) is a serious public health problem in Brazil and worldwide. Despite a growing number of publications on the mechanisms that lead to CKD and its progression, few experimental studies can be translated into clinical practice. One possible reason for this is that, in general, treatment is initiated in concomitance with the onset of the disease, artificially increasing the effectiveness of therapy, since the pathogenic factors involved are more easily neutralized. Far less encouraging results are obtained if treatment is initiated at later stages, when the much more complex interaction between these factors would require more vigorous therapy and the association of two or more drugs. In the present study, we examined the evolution of renal injury in an established model of CKD - 5/6 nephrectomy (Nx) - and the effect of an association between a blocker of the AT-1 receptor, losartan (L), and hydrochlorothiazide (H) - so far, the most effective therapeutic regimen for the Nx model. One hundred ninety-six adult male Munich-Wistar rats were subjected to Nx and divided into four groups: Nx, no treatment; L, receiving L monotherapy; LH, receiving the L+H association, and AHHz, treated with a combination of the calcium channel blocker, amlodipine, the smooth muscle relaxant, hydralazine, and H. This latter group was used to lower blood pressure (BP) independently of the renin-angiotensin system, thus functioning as a control for this parameter. A group of rats subjected to sham nephrectomy (Sham) was also studied. Two study protocols were followed. In the first (Protocol 1), the treatments were initiated 60 days after Nx, aiming to simulate a relatively early stage of CKD, when functional and structural damage is still limited. In the second protocol (Protocol 2), the same treatments were started 120 days after Nx, to mimic advanced human CKD. As expected, CKD progressed to more advanced stages in both protocols. However, mortality and the severity of CKD were much higher in Protocol 2 than in Protocol 1. Despite these differences, the effectiveness of treatments in the two protocols was comparable. L treatment promoted only partial protection against the renal damage observed in Group Nx. The association with H provided much more efficient protection: in both protocols, BP, albuminuria, the rate of tubular/interstitial cell proliferation and plasma aldosterone regressed to lower levels than those observed before treatment. Although glomerulosclerosis and interstitial expansion/inflammation were not reversed, LH treatment completely detained the progression of renal injury in both protocols. On the other hand, the AHHz association, despite normalizing BP, failed to prevent the progression of albuminuria and renal injury, indicating that the protective effect of the LH association was not due to a systemic hemodynamic action. Conclusions: 1) the present results do not support the contention that thiazides have no effect in very advanced stages of CKD, in which most of the kidney function has been lost, 2) the LH association is effective even in advanced stages of nephropathy in the Nx model, arresting progression and keeping injury at pretreatment levels, although it promotes no regression of the renal lesions; 3) LH-induced renoprotection cannot be explained simply by its antihypertensive action, although an effect on intraglomerular pressure cannot be excluded, 4) the mechanisms of LH renoprotection remain unclear, although they are likely to involve a combination of anti-inflammatory and hemodynamic effects, besides a remarkable reduction in the production of aldosterone