1. Hábitos alimentares, hiperhomocisteinémia e doença cardiovascular na diabetes do tipo 2
- Author
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Valente, Ana Margarida Saraiva, 1979, Costa, Helena Soares, Bicho, Manuel Diamantino Pires, and Bicho, Manuel Pires, 1950
- Subjects
Doenças cardiovasculares ,Nutrição Aplicada ,Diabetes mellitus tipo 2 ,Homocisteína ,Doença Cardiovascular ,Obesidade ,Alimentação ,Teses de doutoramento - 2014 ,Dieta - Abstract
Tese de doutoramento em Ciências e Tecnologias da Saúde (Nutrição), apresentada à Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, 2013. Helena Soares Costa: Departamento de Alimentação e Nutrição do INSA. [PT] INTRODUÇÃO: A diabetes mellitus é uma doença crónica com elevados custos sociais, humanos e económicos. É actualmente considerada um dos maiores problemas de saúde pública e só em Portugal existem mais de um milhão de diabéticos. A diabetes mellitus tipo 2 e a alteração do metabolismo da homocisteína estão ambas associados com a doença cardiovascular. Diversos estudos epidemiológicos indicam que a hiperhomocisteinémia moderada aumenta o stress oxidante, promovendo a formação da placa de ateroma. Este mecanismo pode ser reduzido por uma alimentação rica em micronutrientes antioxidantes. Diversos estudos têm demonstrado que o aumento da ingestão de alimentos ricos em vitaminas A, C, E, e carotenóides reduz a progressão da aterosclerose e previne o aparecimento da doença cardiovascular. A quantificação e avaliação dos níveis plasmáticos de homocisteína em diabéticos tipo 2 não é uma prática comum em Portugal. Os estudos nacionais nesta área, não caracterizam globalmente o risco de aparecimento e/ou progressão de complicações vasculares, por aumento dos níveis plasmáticos de homocisteína e cisteína e alteração dos níveis séricos dos marcadores de stress oxidante e de vitaminas antioxidantes na diabetes tipo 2. OBJECTIVOS: (1) Avaliar o estado nutricional de uma amostra da população Portuguesa e relacionar a obesidade com os níveis plasmáticos ou séricos dos compostos bioquímicos em estudo; (2) Caracterizar os hábitos alimentares da população em estudo e correlacioná-los com os seus níveis plasmáticos da homocisteína e cisteína; (3) Relacionar a presença de angiopatia diabética do tipo 2 com a hiperhomocisteinémia, hipercisteinémia, o stress oxidante e com a diminuição dos níveis plasmáticos ou séricos de compostos antioxidantes (vitaminas A, C e E e carotenóides) e de cofactores do metabolismo da homocisteína (vitaminas B12, B6 e folatos); (4) Avaliar o contributo da variação genética da haptoglobina e da enzima metilenotetrahidrofolato redutase para os níveis plasmáticos da homocisteína e cisteína na angiopatia diabética. MÉTODOS: Foi realizado um estudo do tipo caso-controlo de base populacional em 300 adultos Portugueses de ambos os géneros, com idades entre 40 e os 75 anos. A população em estudo foi dividida em três grupos: grupo I - 75 diabéticos tipo 2 com angiopatia; grupo II - 75 diabéticos tipo 2 sem angiopatia; grupo III - 150 controlos não diabéticos. Os níveis plasmáticos de homocisteína, cisteína, malondialdeído, vitaminas B6, C, A e E, e carotenóides foram determinados por métodos de cromatografia líquida de elevada resolução. O doseamento de vitamina B12 e ácido fólico no soro foi efectuado pelo método de electroquimioluminescência. Foram identificados os polimorfismos da haptoglobina e o C677T da metilenotetrahidrofolato redutase nos dois grupos de diabéticos. Os dados antropométricos foram obtidos por técnicas de referência e a prevalência de obesidade foi avaliada por três metodologias. A composição corporal dos participantes foi avaliada pelo método de bioimpedância tetrapolar. A percentagem de gordura corporal foi também calculada pela aplicação de 9 equações antropométricas. A concordância entre as equações antropométricas e o método da bioimpedância foi avaliada pela análise de Bland-Altman e pelo critério de Lohman. Foi aplicado um questionário padrão para a obtenção de dados gerais, clínicos e de actividade física. Os hábitos alimentares dos participantes dos últimos 12 meses foram avaliados por um questionário de frequência alimentar validado para a população adulta Portuguesa. A análise estatística dos dados foi realizada utilizando os softwares SPSS® , versão 20.0 e MedCalc® , versão 12.3.0. RESULTADOS: De acordo com o critério de avaliação do índice de massa corporal, a prevalência de obesidade foi superior nos dois grupos de diabéticos (grupo I: 57,3% vs. grupo II: 45,4%) quando comparada com o grupo dos não diabéticos (16,8%). Quando a metodologia aplicada foi a avaliação do perímetro abdominal, a prevalência de obesidade foi muito elevada para todos os grupos (>50%) e significativamente superior nos grupos I e II (70,7%) em relação ao grupo III (51,0%). A prevalência de obesidade avaliada pela percentagem de gordura corporal (método de bioimpedância) foi também muito elevada em toda a população (>75%), mas sem diferenças estatísticas entre grupos. A equação de Deurenberg (1998) foi a mais concordante com o método de bioimpedância. Os resultados da composição corporal demonstraram que as percentagens médias de gordura corporal, massa magra e água corporal total foram muito semelhantes entre grupos. A prevalência de desidratação na população estudada foi muito elevada (>55%). A ingestão média diária de energia e de gordura total foi superior no grupo I em relação ao grupo III. A ingestão média diária de hidratos de carbono foi semelhante em todos os grupos e a de proteína foi superior nos diabéticos em relação aos controlos. A ingestão média diária de água foi para todos os grupos inferior aos valores recomendados pela Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar. A prevalência de inadequação da ingestão de fibra total foi superior a 50% em todos os grupos. A inadequação de ingestão de ácido eicosapentaenóico, ácido docosahexaenóico e de ácidos gordos ómega-6 e ómega-3 foi muito elevada para toda a população estudada (>70%). A prevalência de ingestão de sódio alimentar total acima do valor recomendado pela Organização Mundial de Saúde foi muito elevada em todos os grupos (>80%). A prevalência de inadequação da ingestão de 8 micronutrientes foi superior a 55% em todos os grupos, sendo que, o grupo dos não diabéticos foi o que apresentou maior prevalência de inadequação para 10 dos 24 micronutrientes avaliados. O padrão de ingestão de vitaminas e minerais nos dois grupos de diabéticos tipo 2 muito semelhante. A presença da diabetes mellitus tipo 2 aumenta o risco de ter hiperhomocisteinémia, níveis elevados de malondialdeído e hipovitaminose C. A angiopatia aumenta a probabilidade de ocorrência de hiperhomocisteinémia e de stress oxidante mas não de hipovitaminose C. A prevalência de baixos níveis plasmáticos de ácido ascórbico e piridoxal-5-fosfato na população avaliada foi relevante (>30%). Foram observadas associações directas da homocisteína, cisteína e malondialdeído com o índice de massa corporal, perímetro abdominal e a gordura corporal. Por sua vez, foi observada uma relação inversa do ácido ascórbico, luteína e β-criptoxantina com os mesmos parâmetros antropométricos. Na relação entre a ingestão alimentar e as concentrações séricas de aminotióis, observou-se uma associação directa da homocisteína e cisteína com a ingestão de metionina e lisina. A distribuição dos polimorfismos da haptoglobina e do C677T da metilenotetrahidrofolato redutase foi semelhante nos dois grupos de diabéticos estudados. A presença do genótipo Hp 2-1 foi associada com a predisposição para a ocorrência de hiperhomocisteinémia e hipercisteinémia nos diabéticos tipo 2 com angiopatia. Os diabéticos do grupo I portadores dos genótipos Hp 2-1 ou Hp 2-2 tiveram um risco cerca de quatro vezes superior hiperhomocisteinémia do que os diabéticos sem angiopatia. A presença dos genótipos C677T e 677TT nos diabéticos do grupo I aumentou em cerca de cinco vezes a probabilidade de ocorrência de hiperhomocisteinémia em relação aos diabéticos do grupo II. O efeito combinado do polimorfismo da haptoglobina com o polimorfismo C677T da metilenotetrahidrofolato redutase aumentou o risco de hipercisteinémia nos diabéticos com angiopatia. CONCLUSÃO: A prevalência de obesidade foi superior a 70% para toda a população quando avaliada pelos critérios da percentagem de gordura corporal ou do perímetro abdominal. A equação de Deurenberg (1998) demonstrou ser a mais adequada para avaliar a percentagem de gordura corporal, em adultos Caucasianos com ou sem diabetes do tipo 2. Os dois grupos de diabéticos apresentaram um padrão de ingestão de nutrientes semelhante e uma prevalência de inadequação da ingestão inferior à do grupo controlo para 10 dos 24 micronutrientes avaliados. A diabetes mellitus tipo 2 é um factor de predisposição para a hiperhomocisteinémia, hipercisteinémia, stress oxidante e hipovitaminose C. A obesidade na diabetes tipo 2 está directamente associada com a homocisteína, cisteína e malondialdeído e inversamente com o ácido ascórbico, luteína e β-criptoxantina. A presença dos genótipos Hp 2-1 ou Hp 2-2 em diabéticos tipo 2 com angiopatia predispõe para a hiperhomocisteinémia e hipercisteinémia. A angiopatia nos diabéticos do tipo 2 portadores dos genótipos CT ou TT do polimorfismo C677T da metilenotetrahidrofolato redutase favorece a hiperhomocisteinémia. A interacção entre os genótipos Hp 2-1 e C677T da metilenotetrahidrofolato redutase potencia a presença de hipercisteinémia. [ENG] Diabetes mellitus is a chronic disease with high social, human and financial costs. Nowadays it is considered one of the greatest public health problems and only in Portugal there are over a million of diabetics. Type 2 diabetes and changes of homocysteine metabolism are both associated with the cardiovascular disease. Several epidemiological studies indicate that moderate hyperhomocysteinemia increases oxidative stress by promoting the formation of atheroma plaque. This mechanism can be reduced by a rich diet in antioxidant micronutrients. Several studies have shown that increasing the intake of good food sources of vitamins A, C, E and carotenoids, reduces atherosclerosis progression and prevents the development of cardiovascular disease. The quantification and assessment of plasma homocysteine levels in type 2 diabetics is not a common practice in Portugal. National studies on this topic, do not characterize the overall risk of development and/or progression of vascular complications by increasing plasma levels of homocysteine and cysteine, and also by serum or plasma changes of oxidative stress markers and antioxidant vitamins in type 2 diabetes. AIMS: (1) To assess the nutritional status of a sample of the Portuguese population and to relate obesity with serum or plasma levels of biochemical compounds under study, (2) To characterize the dietary habits of the study population and to correlate them with its plasma levels of homocysteine and cysteine; (3) To relate the presence of type 2 diabetic angiopathy with hyperhomocysteinaemia, hypercysteinaemia, oxidative stress and decreased levels of plasma or serum antioxidants (vitamins A, C and E and carotenoids) and cofactors of homocysteine metabolism (vitamins B12, B6 and folate) and, (4) to evaluate the contribution of genetic variation of Hp and the C667T polymorphism of methylenetetrahydrofolate reductase with plasma levels of homocysteine and cysteine in diabetic angiopathy. METHODS: A population-based case-control study in 300 Portuguese adults of both genders, aged 40 to 75 years was performed. The study population was divided into three groups: group I - 75 type 2 diabetics with angiopathy, group II - 75 type 2 diabetics without angiopathy, group III - 150 controls. Plasma levels of homocysteine, cysteine, malondialdehyde, vitamins B6, C, A and E and carotenoids were measured by high-performance liquid chromatographic methods. The assay to measure vitamin B12 and folate in serum was carried out by an electrochemiluminescence method. The polymorphisms of haptoglobin and the C677T of methylenetetrahydrofolate reductase were identified in both of the studied diabetic groups. Anthropometric data were obtained by standard techniques and the prevalence of obesity was assessed by three different methodologies. The body composition of the participants was assessed by applying the tetrapolar bioimpedance method. The percentage of body fat was also calculated by applying 9 anthropometric equations. The agreement between anthropometric equations and bioimpedance method was evaluated by performing the Bland-Altman analysis and applying the Lohman criterion. A standard questionnaire was also performed to obtain general data, clinical and physical activity. The eating habits of the participants in the past 12 months were assessed by applying a food frequency questionnaire validated for the Portuguese adult population. The statistical analysis was performed using SPSS® version 20.0 and MedCalc® version 12.3.0. RESULTS: According to the evaluation criteria of body mass index, the prevalence of obesity was higher in both diabetic groups (group I: 57.3% vs. Group II: 45.4%) compared with the group of nondiabetic (16.8%). When the abdominal waist methodology was applied, the prevalence of obesity was very high in all groups (>50%) and significantly higher in groups I and II (70.7%) compared to group III (51.0 %). Obesity prevalence assessed by the percentage of body fat (bioimpedance method) was also very high in the whole population (>75%), but not statistically different between groups. The Deurenberg equation (1998) was the most consistent with the bioimpedance method. The method of body mass index underestimated the prevalence of obesity in the studied population. The body composition results showed that the average of body fat percentage, lean body mass and total body water were similar between groups. The prevalence of dehydration in the study population was very high (>55%). The average daily intake of energy and total fat was higher in group I than in group III. The average daily intake of carbohydrates was similar in all groups and that of protein was higher in diabetic patients compared to controls. The average daily intake of water for all groups was lower than the values recommended by the European Food Safety Authority. The prevalence of inadequate intake of total dietary fiber was greater than 50% in all groups. Inadequate intake of eicosapentaenoic acid, docosahexaenoic acid, omega-6 and omega-3 fatty acids was very high for the whole study population (>70%). The prevalence of total dietary sodium intake above the amount recommended by the World Health Organization was very high in all groups (>80%). The prevalence of inadequate intake of eight micronutrients was above 55% in all groups and the non-diabetic group showed the highest prevalence of inadequacy for ten of the 24 micronutrients assessed. The pattern of intake of vitamins and minerals in the two groups of type 2 diabetes was very similar. The presence of type 2 diabetes increases the risk of hyperhomocysteinemia, high levels of malondialdehyde and that of hypovitaminosis C. Angiopathy increases the occurrence probability of hyperhomocysteinemia and oxidative stress but not hypovitaminosis C. The prevalence of low plasma levels of ascorbic acid and pyridoxal-5-phosphate in the studied population was relevant (>30%). Direct associations of homocysteine, cysteine and malondialdehyde with body mass index, waist circumference and body fat were observed. In turn, there was an inverse relationship of ascorbic acid, lutein and β-cryptoxanthin with the same anthropometric parameters. In the relation between food intake and serum concentrations of aminothiols, a direct association of homocysteine and cysteine with the intake of methionine and lysine was observed. The distribution of haptoglobin and the C667T methylenetetrahydrofolate reductase polymorphisms was similar in both groups of the studied diabetics. The presence of the Hp 2-1 genotype was associated with a predisposition to the occurrence of hyperhomocysteinemia and hypercysteinemia in type 2 diabetics with angiopathy. The diabetic patients of group I who carry the genotypes Hp 2-1 or Hp 2-2 had a probability risk four times higher to have an elevated plasma homocysteine level than diabetics without angiopathy. The presence of 667TT and C667T genotypes in diabetic patients of group I increases in five times the occurrence probability to have hyperhomocysteinemia in relation to diabetic patients of group II. The combined effect of the polymorphism of haptoglobin and the C667T of methylenetetrahydrofolate reductase polymorphism increased the occurrence probability of hypercysteinemia in diabetics with angiopathy. CONCLUSION: The prevalence of obesity was greater than 70% in the whole population when evaluated by the criteria of body fat percentage or abdominal waist. The Deurenberg equation (1998) proved to be the most suitable for measuring the body fat percentage in Caucasian adults with or without type 2 diabetes. Both diabetic groups showed a similar pattern of nutrient intake and a prevalence of inadequate intake lower than the obtained in the control group for 10 of the 24 assessed micronutrients. Diabetes mellitus type 2 is a predisposing factor for hyperhomocysteinemia, hypercysteinemia, oxidative stress and hypovitaminosis C. Obesity in type 2 diabetes is directly associated with homocysteine, cysteine and malondialdehyde and inversely with ascorbic acid, lutein and β-cryptoxanthin. The presence of genotypes Hp 2-1 and Hp 2-2 in type 2 diabetics with angiopathy predisposes to hyperhomocysteinemia and hypercysteinemia. Angiopathy in type 2 diabetic patients with the CT or TT genotypes of the C667T polymorphism of methylenetetrahydrofolate reductase promotes hyperhomocysteinemia. The interaction between the genotypes of C667T and Hp 2-1 methylenetetrahydrofolate reductase enhances the presence of hypercysteinaemia. O presente trabalho de investigação foi financiado por uma bolsa de Doutoramento (SFRH/BD/16166/2004/5E4M) e por uma bolsa de investigação (BI) concedida no âmbito do projecto de investigação clínica intitulado “Hábitos alimentares, hiperhomocisteinémia e doença cardiovascular em diabéticos tipo 2“, com a referência PIC/IC/82957/2007, ambas financiadas pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). A realização deste trabalho de investigação beneficiou ainda do apoio financeiro concedido pelo Prémio Fomento Nº106/INSA, pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, I.P. e pelo projecto PIC/IC/82957/2007 financiado pela FCT.
- Published
- 2014