É propósito desta investigação estudar a articulação do desejo e reconhecimento em Paul Ricoeur. Porém, torna-se difícil numa obra imensa e díspar como a de Ricoeur, fazer uma leitura centrada num tema sem desrespeitar o pensamento do autor. E é precisamente pelo carácter interventivo do seu pensamento que importa o seu estudo, nomeadamente no que diz respeito a uma problemática que tem sido, de certo modo, negligenciada pela filosofia e que se mostra cada vez mais relevante nos dias de hoje para uma melhor compreensão da existência humana. Nesta perspectiva, o presente estudo tem como principal objectivo o questionamento do lugar do desejo para uma compreensão global do ser humano nos moldes em que hoje é perspectivado e vivenciado. Mas por outro lado, colmatar a falha filosófica de relegar a problemática do desejo para segundo plano de reflexão, como se o desejo se tratasse de uma dimensão secundaria e que pouco ou nada nos diz sobre o ser humano. Neste sentido, por que razão desejo e reconhecimento norteiam o presente estudo, na demanda da verdade pela identidade humana? Primeiramente, porque privilegiar o desejo é trazer à luz a unidade viva da pessoa enquanto perfeita simbiose entre voluntário e involuntário, é colocar a existência em primeiro plano, enquanto prévia à linguagem e prévia ao pensamento. O que torna a subjectividade mais rica por referência à sua existência: o ser humano não é só um ser cognoscente como mostraram as filosofias reflexivas. O que levou a um reducionismo da sua identidade, ficando como fragmentada. O ser humano é também um ser de necessidades e de afecções. E no domínio da afectividade e do desejo como afirmação originária do ser, o pensamento é de difícil acesso, já que a palavra é demasiada face à existência. Por outro lado, a relação do desejo com o reconhecimento traduz-se na caminhada do homem falível ao homem capaz de agir, desvelando novas capacidades, a de narrar, prometer, perdoar e paralelamente as capacidades sociais que o atestam como um ser relacional. Assim, o reconhecimento-atestação conduz ao reconhecimento mútuo, no qual o sujeito se reconhece e solicita ser reconhecido por aquilo que ele é, o que significa que nunca a consciência ou o sujeito se pode fechar em si. A consciência nunca é consciência de si para si, é antes consciência de si diante de outro, distinta de tudo o resto, o que lhe confere unicidade num jogo de reconhecimento mútuo. Por esta razão, o plano da alteridade assume ao longo do presente estudo uma importância inquestionável na busca pela identidade humana, sendo que o ser humano nada é, quando é só para si. O desejo constitui assim o manifesto do ser humano no palco do mundo, o esforço do indivíduo pela presença, presença a si e presença a um outro em que o reconhecimento é condição essencial para a construção de sua identidade. This research aims to study the link between desire and recognition according to Paul Ricoeur. Considering Ricoeur's vast work, to focus on a theme and not disrespect the author's thought is a rather difficult task. The active role of the author's thought is the most important, namely in regards to an issue that has somewhat been neglected by philosophy and is increasingly relevant today so as to better understand human existence. Within this framework, the main objective of this study is to question the role of desire towards a global understanding of the human being as it is viewed and experienced today. However, the philosophical gap must be bridged in regards to desire being placed second, as if desire were a secondary dimension and that it says little or nothing about the human being. Thus, why are desire and recognition the focus of our study in the quest for truth in human identity? Firstly, because to focus on desire is to bring forth a person's living unit as the perfect symbiosis between the intentional and the unintentional, it is to place existence first, prior to language and prior to thought. This enhances subjectivity by referring its existence: the human being is not only a knowledgeable being, as evidenced by reflective philosophy. This causes its identity to be reduced, as if fragmented. The human being also has needs and affections. And within affection and desire as an existence generating statement, thought is of difficult access because the word exceeds existence. Yet, the relation between desire and recognition is made evident in the path from fallible human to human able to act, revealing other abilities such as those of narrating, promising, forgiving, and simultaneously, the social abilities that attest one is a relational being. As such, recognition-attestation leads to mutual recognition - one recognizes oneself and requests to be recognized for who one is, which means that neither the individual nor awareness may be isolated. Awareness is never awareness of one towards one but rather awareness of one regarding the other, different from all others, making it unique in mutual recognition. Therefore, otherness is unquestionably important in this study concerning the search for human identity, considering that one is nothing when one is that only for oneself. Desire is thus human being's manifesto in the world stage, the individual's struggle for presence, presence before one and before others, recognition being essential for building one's identity.