Busca-se entender a transformação do Direito Empresarial numa sociedade onde a conscientização se torna ecossistêmica. A metodologia utilizada é a revisão bibliográfica crítica. Manuel Castells ensina que ao final do século passado vivemos um momento de superação de paradigma tecnológico, com o advento das tecnologias da informação (CASTELLS, 1999, p. 67). Afirma que uma das características deste novo paradigma é as redes de informação (como a Internet) passarem a ser adotadas como modelo para todas as relações (CASTELLS, pp. 108-109). Por sua vez, Roberto Armando Ramos de Aguiar (2017) aponta que as redes sempre existiram (AGUIAR, 2017, pp. 34-36). Traça uma análise histórica da sociedade tendo elas como paradigma. Afirma que as redes das sociedades primitivas tinham sua coerência na vontade dos indivíduos de pertencerem um universo comum. Tratava-se de uma coerência situada acima dos grupos (AGUIAR, 2017, p. 34), não havendo espaço (numa sociedade de iguais) para a formação de hierarquias (AGUIAR, 2017, p. 15). As redes passam a adquirir verticalidade quando a conscientização coletiva adquire aspecto de competição e disputa. É daí que ocorre a necessidade de criação de entes superiores para a organização da sociedade. Porém, com o advento das tecnologias da informação, as redes voltam a adquirir horizontalidade, favorecendo uma sociedade mais solidária. Diante deste cenário, as instituições herdadas da Modernidade (como o Direito e o Poder Judiciário) acabam por perder seu sentido. Elas deixam de pertencer a uma camada superior de uma ordem verticalizada (que deixa de existir) para se transformar em nodos de respiração das redes (AGUIAR, 2017, p. 38). Tim Brown, ao conceituar o Design Thinking, aponta que a Internet deve ser vista como modelo (e não ferramenta) das relações atuais (BROWN, 2017, p. 28). Para o autor as facilidades das novas tecnologias estão forjando um novo contrato social, com a descentralização do controle das empresas. Elas passam a olhar o consumidor não como usuário final, mas como partícipes dos processos (BROWN, 2017, p. 189). Este é o cenário para o advento da empresa sustentável. O foco de marketing deixa de estar na transformação de desejos em necessidades (que vinha sendo o principal caminho dos negócios). Diante das possibilidades das tecnologias da informação, o foco das empresas sustentáveis passa a ser a transformação de necessidades em serviços e produtos úteis para toda a sociedade. Ocorre assim a mudança da conscientização egossistêmica para a conscientização ecossistêmica. Otto Scharmer (a fim apontar os caminhos da economia ecossistêmica) traça uma evolução da sociedade e do capitalismo em termos da evolução da consciência, de uma Sociedade 1.0 para Sociedade 4.0 (SCHARMER, 2014, pp. 54-61). A Sociedade 1.0 teria como característica a centralidade administrativa. Esta centralidade surge da necessidade (diante de um cenário de guerra de todos contra todos) de constituir-se um agente regulador. Volta-se, assim, aos ensinamentos de Roberto Armando Ramos de Aguiar (quando pontua a verticalização das redes) pois trata-se de uma sociedade baseada na organização hierárquica. Como características positivas dessa sociedade encontra-se a estabilidade e a ordem. As características negativas são a falta de liberdade, de dinamismo social e de iniciativa individual. Quanto mais eficiente for a estabilidade trazida pela Sociedade 1.0 mais as pessoas mudam o foco da necessidade de estabilidade para a necessidade de crescimento. Também existe a busca por maior liberdade e iniciativa individual. Neste tempo surge a Sociedade 2.0, de livre mercado, em que a fonte de poder se transfere para o poder militar do Estado (chicotes) e para o poder baseado no mercado (cenouras). A organização dessa sociedade é centrada na competição, e a conscientização é centrada no indivíduo. Vale dizer, é egossistêmica. Esta sociedade teria como pontos positivos o rápido crescimento, a explosão de iniciativas empreendedoras e o dinamismo. O ponto negativo, porém, é a transformação de tudo em objetos alienáveis e transferíveis (commodity). E esta comodificação sem limites traz efeitos perversos, como a escravização, o trabalho infantil, a destruição ambiental. A fim de combater as externalidades negativas advém diversas propostas, como o surgimento de regulações (direitos trabalhistas, direitos da previdência social) e das subvenções estatais. Otto Sharmer conceitua, a partir deste contexto, a Sociedade 3.0 (que denomina também de capitalismo de stakeholders), quando a sociedade passa a se organizar de forma centrada em grupos de interesse. Assim, surgem, especificamente após o fim da Segunda Guerra Mundial e o advento de modelos como o Estado de Bem-Estar Social e o Estado Subsidiário, os chamados Direitos Coletivos, ou seja, direitos de grupos de interesse, geralmente grupos menos favorecidos e marginalizados, como os trabalhadores e consumidores. Um conceito de direito coletivo pode ser encontrado no Código de Defesa dos Consumidores brasileiro (art. 81, II), como sendo os direitos transindividuais, indivisíveis e de que é titular grupo, categoria ou classe ligadas entre si ou ligadas por uma parte contrária em comum. Thomas Vesting (2016, pp. 31-35), por sua vez, afirma que se trata do estilo de pensamento ou hábito de percepção grupo-pluralista, que o autor denomina conhecimento dos grupos. Este estilo de pensamento ocorre tanto no direito como na ciência em geral, e surge a partir da demanda crescente por conhecimento qualificado, em um mundo modificado pelo aumento da relevância da indústria de produção em massa e da burocracia estatal. Porém, são três as limitações da Sociedade 3.0, a qual se encontra a maioria das sociedades atuais: a) ela tende a favor de grupos de interesses; b) apenas reage, e não prevê ou diminui as externalidades negativas, que são resultados que ninguém deseja (como as catástrofes naturais e econômicas e a miserabilidade); e c) pouca capacidade de criar externalidades positivas. Nesta sociedade grupos de interesses com maior dificuldade de se organizar, por serem muito grandes (como os consumidores) ou por sequer ainda existirem (como as futuras gerações), ficam vulneráveis às decisões dos grupos melhor organizados e com mais recursos (tempo, dinheiro, poder político, poder de argumentação). Conforme afirma Otto Scharmer, os problemas do século XXI não conseguem ser resolvidos com o repertório do século XX, que era voltado para a resolução de problemas centrados no Estado previdenciário (SCHARMER, 2014, p. 59). Esta é uma realidade que observamos a cada plano político e econômico, basicamente fundamentado na ciência (econômica ou não) dos séculos XVIII e XIX. Nas palavras de Boaventura de Sousa Santos, é possível dizer que ainda vivemos no século XIX (SANTOS, 2010, pp. 13-14). Como afirma Antonio Carlos Wolkmer (2015, pp. 60-61), o Direito Moderno não é mais capaz de responder às demandas de uma sociedade complexa, cheia de conflitos e contradições. Otto Scharmer aponta o surgimento de uma Sociedade 4.0, cuja organização é centrada no todo. Nesta sociedade, a conscientização é ecossistêmica, pois o interesse dos players (ou stakeholders) da economia deixa de ser somente o próprio e se estende à conscientização compartilhada do ecossistema (SCHARMER, 2014, p. 61). Neste cenário, os resultados passam a beneficiar todo o sistema, e não apenas parte dele. Para Thomas Vesting (2016, p. 37) ocorre uma transição de um paradigma de grupo plural para um paradigma em rede, onde os grupos pré-estruturados dão lugar para o surgimento de processos de produção de conhecimento fluídos e dinâmicos, havendo o relaxamento das fronteiras entre organizações. Assim, é diante das possibilidades da sociedade da informação e da sociedade 4.0, que os Direitos Coletivos devem dar margem para o surgimento de um Direito ecossistêmico, que analise e aponte soluções que beneficiem toda a sociedade, e não apenas parte dela, os grupos de interesses antagônicos. Por menos favorecidas que possam ser partes beneficiadas, o cenário de disputa entre coletivos (trabalhador-empregador; ambientalistas-agricultura) não possibilita a ascensão de uma sociedade que tenha como prioridade a evolução do todo integral, levando a resultados que ninguém prevê ou deseja. Ainda, esta dicotomia social não apresenta soluções realmente eficientes, mas apenas paliativas. Quanto ao Direito Empresarial, essas soluções paliativas se encontram na fixação de multas, indenizações e penas que não protegem a sociedade dos resultados inesperados, que continuam acontecendo (consumismo desenfreado, miserabilidade e desastres ambientais, políticos e econômicos). [ABSTRACT FROM AUTHOR]