Com base no referencial teórico da saúde coletiva sobre processo de trabalho em saúde e necessidades de saúde, este estudo teve o objetivo de analisar o trabalho em saúde na Estratégia Saúde da Família (ESF) a partir do cuidado oferecido a usuários em insegurança alimentar e nutricional (ISAN), com recorte para pessoas com obesidade. Foi realizado um estudo de caso de abordagem qualitativa em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) localizada na zona leste do município de São Paulo. Foram feitas 11 entrevistas semiestruturadas com trabalhadores da ESF como enfermeiros, profissionais do Núcleo de Apoio a Saúde da Família e médicos. Além disso, a observação participante, entre os meses de julho e agosto de 2019, e a elaboração de um diário de campo deram suporte para a discussão dos achados. Por meio da análise temática, os resultados e a discussão foram apresentados em três seções. Foi possível compreender que a organização dos processos de trabalho na ESF impõe limites ao enfrentamento à obesidade crescente no Brasil. Os profissionais de saúde estão submetidos a um modelo assistencial ainda fortemente pautado pela lógica biomédica, com um vínculo empregatício frágil e pressionados pela lógica de desempenho. Consequentemente, demonstraram ter pouca autonomia e tempo para a definição do seu processo de trabalho. A organização do trabalho na ESF e a falta de domínio do processo de trabalho conduzem os profissionais a uma reprodução de atividades assistenciais produzindo um cuidado fragmentado, protocolar e voltado para o cumprimento das metas de produção pré estabelecidas. No caso do processo de trabalho voltado para pessoas com obesidade, a lógica individualizante fortemente presente nos pilares da promoção da saúde reforça responsabilização, estigmatização e culpabilização dos usuários com obesidade. Assim, a finalidade das atividades desenvolvidas na UBS acaba se voltando para a perda de peso e para a mudança do comportamento de risco, mesmo que os profissionais compreendam que a determinação da obesidade tem raízes na organização social. Como desafios para o campo da saúde coletiva, destaca-se a necessidade do fortalecimento de uma concepção de ISAN que extrapole a noção de risco à saúde e que se aproxime das raízes causadoras da obesidade. Ademais, a necessidade de fortalecimento de modelos assistenciais que busquem a coletivização das questões de saúde e alimentação, para assim possibilitar a construção de processos de trabalho que se aproximem das necessidades de saúde dos usuários e também dos trabalhadores de saúde. Esta pesquisa lança um olhar sobre as contradições inerentes ao processo de trabalho em saúde no capitalismo e suas implicações sobre as práticas de cuidado destinadas às pessoas com obesidade. Based on the theoretical framework of collective health about health work process and health needs, this study aimed to analyze health work in the Family Health Strategy (ESF) starting from the care offered to users with food and nutritional insecurity, particularly people with obesity. A case study of qualitative approach was carried out in a Basic Health Unit (UBS) located on the East Side of São Paulo city. Eleven semi-structured calls to ESF workers such as nurses, professionals from the Family Health Support Center and doctors have been made. In addition, participant observation between July and August 2019, and the preparation of a field diary provided support for discussing the findings. Through thematic analysis, results and discussion were presented in three sections. It was possible to understand that the organization of work processes in ESF imposes limits on coping with growing obesity in Brazil. Health professionals are subjected to a care model that is still strongly guided by biomedical logic, with a fragile employment relationship and pressured by the logic of performance. Consequently, they demonstrated to have little autonomy and time to define their work process. The organization of work in ESF and the lack of mastery of the work process lead professionals to a reproduction of care activities, producing fragmented, protocol-based care aimed at meeting pre-established production goals. In the case of work processes aimed at people with obesity, the individualizing logic that is strongly present in the pillars of health promotion reinforces accountability, stigmatization and blaming of users with obesity. Thus, the purpose of the activities developed in UBS ends up focusing on weight loss and change in risky behavior, even though professionals understand that the determination of obesity has its roots in social organization. As challenges for the field of collective health, the need to strengthen a concept of food and nutritional insecurity that goes beyond the notion of risk to health and that approaches the root causes of obesity stands out. Besides that, the need to strengthen health care models that seek to collectivize health and food issues, in order to enable the construction of work processes that are closer to the health needs of users and health workers. This research casts a glance at the contradictions inherent in the health work process under capitalism and its implications on care practices for people with obesity.