A América do Sul (AS) possui uma área de ~17,8 milhões de km² e contribui com cerca de 30 % do volume total de água escoado para os oceanos. Gerenciar os recursos hídricos continentais na AS é uma tarefa desafiadora devido à heterogeneidade das características climáticas, suscetibilidade a cheias e secas, complexidade dos sistemas de rios e existência de usos múltiplos da água, em particular a produção de energia onde a hidroeletricidade corresponde por ~50 % da capacidade instalada na AS. Previsões de vazão, por exemplo, são essenciais para a operação de reservatórios e para melhorar a preparação contra eventos extremos, os quais podem ocorrer em múltiplas escalas espaciais e afetar extensas áreas inclusive para além de fronteiras políticas. Neste sentido, há necessidade de ferramentas que possibilitem quantificar fluxos hidrológicos com consistência espaço-temporal na AS, bem como prever a condição futura dos rios com estimativa de incerteza para dar suporte à tomada de decisão. O objetivo desta tese foi estabelecer uma base técnica para modelagem hidrológica com abrangência da América do Sul e dar contribuições para previsão de vazões em escala continental, no horizonte de médio prazo (até 15 dias). O modelo hidrológico MGB foi adaptado para simulação hidrológica–hidrodinâmica em múltiplas bacias sul americanas a partir de técnicas de geoprocessamento, produtos de sensoriamento remoto e outras bases de dados globais. O modelo desenvolvido, denominado MGB–SA, teve representação satisfatória de vazões em intervalo de tempo diário, apresentando acurácia superior à de modelos globais estado-da-arte. Também foram representados de forma adequada padrões de sazonalidade e magnitude de evapotranspiração e armazenamento terrestre de água nas principais bacias da AS, com desempenho razoável para os níveis simulados. Através de um experimento de previsão que assume o modelo hidrológico como livre de erros, foi identificado que previsões de chuva por conjunto (ensemble) com horizonte de médio prazo podem contribuir para a destreza das previsões de vazão com até 15 dias à frente. Na avaliação de desempenho geral das previsões de vazão, observou-se maior destreza para regiões situadas ao leste e sudeste da América do Sul, incluindo bacias como Uruguai, Alto Paraná, São Francisco, Parnaíba e Tocantins-Araguaia. Em relação à discriminação entre ocorrência e não ocorrência de eventos de vazão elevada, a destreza da previsão foi maior nos rios do sul do Brasil. Além disso, as previsões exibiram maior destreza para acurácia geral e discriminação em regiões de clima temperado e úmido (sub-tropical). Quando considerados ambos os erros do modelo hidrológico e da precipitação prevista, as previsões de vazão com horizonte de médio prazo demonstraram baixa ou nenhuma destreza na maioria das localidades analisadas além de um grande viés probabilístico, com a maior parte das observações situando-se fora dos limites do conjunto mesmo para antecedências mais longas após 1 semana à frente. Com aplicação de pós-processamento estatístico a destreza das previsões de vazão aumentou substancialmente, melhorando a consistência estatística e proporcionando largura de incerteza geralmente inferior ao da climatologia das vazões observadas. O desempenho de séries temporais de previsão por conjunto obtidas de distribuições preditivas pós-processadas também foi avaliado, demonstrando limitações principalmente em condições de baixo espalhamento do conjunto bruto. Por fim, os resultados deste trabalho sugerem que o modelo desenvolvido pode servir como uma ferramenta para dar suporte a pesquisas que contemplem os recursos hídricos da AS de forma integrada, e que previsões de vazão com destreza no horizonte de médio prazo podem ser obtidas na escala continental mesmo com dados in situ limitados. South America (SA) has an area of ~17.8 million km² and contributes around 30 % of the global runoff to the oceans. Managing the continental waters in SA is a challenge given the wide range of climatic characteristics, susceptibility to floods and droughts, complexity of river systems and existence of multiple water uses, in particular the energy production where hydropower accounts for ~50 % of the total installed capacity. Streamflow forecasts, for instance, are essential for reservoir operation and to improve preparedness against extreme hydrometeorological events, which can occur on multiple spatial scales and affect extensive regions including areas beyond the political boundaries. In this context, there is a need for tools that enable to quantify hydrological fluxes in SA with spatiotemporal consistency, as well as to predict future river conditions with uncertainty estimates to support decision making. The objective of this thesis was to establish a technical basis for hydrological modeling in the South America domain and contribute to medium-range (up to 15 days) streamflow forecasting at the continental scale. The MGB hydrological model was adapted for simulation of multiple South American basins by using hydrologic–hydrodynamic methods, geoprocessing techniques, remote sensing products and other global scale datasets. The developed model, named MGB–SA, showed a satisfactory representation of daily discharges and exhibited higher accuracy compared with state-of-the-art global models. Seasonality and magnitude of both evapotranspiration and terrestrial water storage were adequately represented at the scale of main SA basins, with a reasonable performance regarding the simulated water levels. Through a forecasting experiment that assumes the hydrological model as error-free, it was found that medium-range ensemble precipitation forecasts can contribute to the skill of streamflow forecasts up to 15 days ahead. Overall skill was higher in the eastern and southeastern SA regions, which include large basins such as Uruguay, Upper Paraná, São Francisco, Parnaíba and Tocantins-Araguaia. Skill in discrimination between the occurrence and non-occurrence of high flow events was mainly observed in rivers of southern Brazil. In addition, forecasts showed better skill in terms of overall quality and discrimination in warm temperate, fully humid regions. When the errors of both hydrological model and predicted precipitation were taken into account, medium-range streamflow forecasts exhibited low or no skill in most of the analyzed locations in addition to a large probabilistic bias, with most of the observations falling outside the ensemble limits even at longer lead times, after 1 week ahead. Statistical postprocessing substantially improved streamflow forecast skill, enhancing statistical consistency and generally providing lower uncertainty width compared with that of observed climatology. The performance of streamflow ensemble traces derived from postprocessed predictive distributions was also evaluated, showing limitations mainly in conditions for which the raw ensemble spread is low. Finally, the results of this work suggest that the developed model can be used to simulate the South American water resources in an integrated manner, and that skillful, medium-range streamflow forecasts could be obtained at the continental scale of SA even with limited in situ data.